domingo, 21 de junho de 2009

Vox Populi

Socos e chutes.
A cena era dantesca, quase bíblica. A “justiça” sendo feita a paus e pedras, mas aqui não havia messias algum para acalmar a cólera nos corações de ninguém.
Socos e chutes desferidos desordenadamente pelos mais de trinta rostos insandecidos aglomerados como abóboda sobre o garoto… “Garoto não!” interpelariam os revoltos, se suas atenções não estivessem completamente voltadas para a demonstração de ódio e indignação que ocorria naquele terreno baldio. E continuariam.
“Tem que ser um animal para fazer uma coisa dessas!”
Socos e chutes que atingiam o frágil corpo de quinze anos quebrando ossos e deformando a carne.
O espetáculo era tão excitante que o terreno tornou-se palco, a calçada, primeira fila, disputada a cotoveladas pelos moradores da rua.
“Garoto não! Tem que ser um animal para fazer uma coisa dessas!”
O que ele fez?
Esmagou a cabeça de uma menina de treze anos com uma pedra, assim como a sua era agora esmagada a punhos cerrados?!
“Tem que ser um animal pra fazer uma coisa dessas!”
Em pouco tempo, não era mais nem animal, apenas um corpo sem vida estirado ao chão. Ironicamente caído ao lado da menina que matara momentos antes.
Pareciam irmãos, seus rostos eram idênticos, massas deformadas de carne ensanguentada. Eram Adão e Eva, eram o fim da inocência.
Os mais de trinta ficaram lá, parados em clímax, olhando para o que haviam feito. Rapidamente foi jogado um lençol branco sobre os corpos, pois eles lembravam como nós, cidadãos de bem, homens trabalhadores e mulheres de família, podemos ser selvagens.
Os mais de trinta conversavam entre si e se tranquilizavam, em seu julgamento os fins justificavam os meios. O engraçado é que, visto que o resultado era o mesmo, uma menina e um garoto mortos, e os motivos que inspiraram cada um dos assassínios serem os meios, o garoto estava tão justificado quanto o júri carrasco, ou tão culpado!
Devíamos ter mais cuidado com nossos julgamentos. A história mostra que nunca fomos muito justos neles e, já que citamos a Bíblia, vamos lembrar do julgamento mais importante do texto sagrado, o realizado por Pôncios Pilatos.
Nele ficou claro que não temos o menor bom senso para decidirmos sobre o certo e o errado. Mas se somos péssimos para julgar, por outro lado somos especialistas em nos arrependermos. O mentor da humanidade! O arrependimento! Principal forma de aprendizado dos homens, tão importante que habita em nossa história, literatura, arte, religião… E habita também naquele lençol branco jogado sobre os corpos que, como o santo sudário, representa nossa vergonha, nosso arrependimento diante de nossas decisões, nosso desejo de encobrir nossos erros.
Se os mais de trinta estavam certos ou errados, não estou apto a julgar, também sou apenas um homem. Sei apenas que no final, todos sem exceção, tinham sangue em suas mãos, até mesmo aqueles que as lavaram, como Pôncios Pilatos!

Nenhum comentário:

Postar um comentário